Por conta da volta do uso da batina por um bom número de padres, têm aparecido discussões em torno desta vestimenta clerical. Afinal, em que o seu uso agrega ao processo de evangelização?
Há reflexões bem fundamentadas para justificar o seu uso, como também para justificar o não uso. A questão das vestes clericais pode também ser estendida para a questão das vestes litúrgicas. Até o Papa Francisco chegou a fazer uma relação com o exagerado uso de “rendas” que parecem se espelhar mais em avós do que propriamente ser relevante para uma profunda celebração do mistério de Deus revelado em Jesus Cristo.
Esta coluna não tem nenhuma pretensão de pontificar sobre tal tema, pois para nós a questão chave é a pergunta feita acima. O que está em jogo é o trabalho pastoral e o caminho sinodal tão fundamental para que a Igreja Católica seja sal, luz e fermento no meio do mundo.
Também não se trata de condenar o uso da batina em si. Dom Helder usava batina e sabemos muito bem de sua coerência. Mas foi o tempo daquele ministro ordenado com uma batina surrada de tanto caminhar junto com o povo. E certamente deve existir quem use e não vá em direção de algo que consideramos extremamente relevante, isto é, um uso que mais esconde do que revela.
Após o Vaticano II a veste clerical deixou de ser obrigatória e a maior parte dos presbíteros deixou de usar. Tal fato não trouxe nenhum agravante para a piora do trabalho pastoral, muito pelo contrário. A identificação e a aproximação do padre com o povo só trouxe uma melhora na compreensão do serviço daquele que está junto, como irmão, ainda que tenha uma missão diferenciada.
Contudo, há sinais bem indicativos de que o uso da batina não represente nenhum avanço do ponto de vista pastoral e evangelizador. É interessante observar que tal realidade tem se configurado predominantemente entre os padres mais jovens, acarretando inclusive um custo econômico bem abusivo. Costuma-se justificar que para Deus se deve oferecer o melhor. Mas de que Deus se está falando? Seria Aquele revelado em uma criança na manjedoura? Daquele que não tinha onde reclinar a cabeça e morreu na cruz? Seria o Deus do óbolo da viúva? Seria o Deus do Sermão da Montanha ou do capitulo 25 de Mateus: “Tive fome e me deste de comer, tive sede…”?
Um olhar cuidadoso, sem generalizações obviamente, mostra que a batina pode apontar hoje não em direção de um desprendimento, mas para configurar o exercício de um “poder sagrado” autoritário e não dialogal. O ministro ordenando, ou como se costuma afirmar, de forma veemente, o “sacerdote”, passa a ser visto quase como um homem infalível, mãos ungidas para exercer não apenas a presidência da Eucaristia, mas para afirmar um poder clerical que não admite questionamento. Um leigo ou leiga que tenha condições de travar algum dialogo com fundamento teológico, pode ser escorraçado. A dimensão sinodal praticamente se torna inexistente.
Evidentemente não se pode aplicar uma relação direta entre o uso da batina e autoritarismo, mas a pura e simples observação dá indicativos nesta direção. Quando um padre se deixa fotografar com roupa clerical com uma arma na mão, caso extremo, qual mensagem ele está passando? Sem falar que a batina pode esconder também outras situações um tanto quanto complexas.
O colarinho clerical é mais discreto, mas também pode esconder mais do que revelar. Não se questiona o fato de que em certas ocasiões é importante uma veste que simbolize a instituição católica. Porém, é preciso usar em todos os espaços? Alguém vê um médico usando jaleco vinte quatro horas por dia?
A batina surrada do velho padre foi muitas vezes substituída por uma batina impecável que aponta para quatro “cês”: carro, celular, casa, e boa comida.
Graças a Deus temos bons padres que ainda não se deixaram levar por essa onda de “parecer ser” e testemunham uma vida consagrada a causa do Reino de Deus deixada por Nosso Senhor Jesus Cristo.